Eterno em consequências?

 


A paz do Senhor 

Para negarem o uso do termo “eterno” no sentido de duração, os aniquilacionistas afirmam que ele se refere apenas a consequências. Assim, o castigo seria eterno em consequências, o horror também seria eterno em consequências, e outros textos usados como referência ao fim dos ímpios seriam interpretados da mesma forma. Para sustentarem essa conclusão, usam passagens supostamente paralelas em entendimento, fora de contexto e sem o devido entendimento, forçando o texto a dizer o que ele não diz. Nesta publicação, farei uma análise de todos os "textos-provas" dessa nova redefinição de termos para adaptar a Bíblia a um entendimento alheio ao seu ensino.

Marcos 3:29 e o suposto pecado eterno em consequências 

"Mas aquele que blasfemar contra o Espírito Santo nunca obterá perdão; é réu de pecado eterno." (Marcos 3:29)

Olhando para este texto, nossos amigos, de forma convencida, argumentam que ele não pode se referir ao pecado eterno no sentido de duração, como se a pessoa estivesse constantemente cometendo aquele pecado. Assim, interpretam que o pecado é eterno apenas em suas consequências, não em sua continuidade ou duração.

O "Comentário Grego Exegético do Novo Testamento" traz uma excelente resposta a essa interpretação duvidosa:

"O termo αἰωνίου ἁμαρτήματος (pecado eterno) em Marcos 3:29 deve ser compreendido como eterno em sua culpa, não como um pecado que se repete eternamente. Como isso é equivalente a 'nunca tem perdão', devemos conceber o pecado como imperdoável, não como um pecado em si que se perpetua. A ideia é a de um pecado imperdoável, não de uma ação contínua e repetitiva." [1]

A expressão “pecado eterno” (αἰωνίου ἁμαρτήματος) em Marcos 3:29 significa, portanto, simplesmente que a culpa nunca será removida da pessoa. Isso contrasta com João 1:29, onde Jesus é apresentado como o “Cordeiro de Deus que tira (αἴρων) o pecado do mundo”. Ou seja, enquanto Cristo veio para remover o pecado do homem arrependido, aquele que blasfema contra o Espírito Santo rejeita o único meio de purificação e permanece para sempre com sua culpa. O pecado é eterno não pelas consequências, mas porque jamais será retirado da pessoa.

"Se alguém disser alguma palavra contra o Filho do Homem, isso lhe será perdoado; mas, se alguém falar contra o Espírito Santo, isso não lhe será perdoado, nem neste mundo nem no porvir." Mateus 12:32 NAA

Hebreus 5:9 e a suposta eterna salvação em consequências 

"Ainda que era Filho, aprendeu a obediência por aquilo que padeceu; e, sendo ele consumado, veio a ser a causa da eterna salvação para todos os que lhe obedecem; chamado por Deus sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque." Hebreus 5:8-10

O texto diz que a salvação é eterna. Curiosamente, outra parte do mesmo livro diz algo relacionado:

"Mas este, porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo. Portanto, pode também salvar perfeitamente os que por ele se achegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles." Hebreus 7:24-25

Hebreus 5:8-9 não restringe a salvação apenas ao evento da cruz, como tentam dizer a todo custo nossos amigos, mas à plena obra de Cristo, que inclui seu sofrimento, sua obediência, sua ressurreição e, sobretudo, sua contínua intercessão . Em Hebreus 7:25, o autor confirma isso: “ pode salvar perfeitamente (ou totalmente) os que por ele se achegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles”. Como visto, essa salvação eterna não se refere apenas aos efeitos do sacrifício, como sustentam os aniquilacionistas — que a reduzem a uma consequência definitiva sem continuidade —, mas está também ligada à natureza eterna de Cristo e à sua função sacerdotal contínua

Continuando nessa mesma ideia de salvação eterna, os aniquilacionistas também recorrem à expressão “salvação eterna”, mencionada em Isaías 45:17, para argumentar que não é a salvação em si que é eterna, mas apenas os seus efeitos.

O texto diz:

"Israel, porém, será salvo pelo Senhor com salvação eterna; vocês não serão envergonhados nem humilhados, por toda a eternidade." Isaías 45:17 NAA

 No entanto, lamentavelmente, esquecem-se de considerar o contexto geral do livro, onde se afirma que "a salvação do Senhor durará de geração em geração" (Is 51:8).

O termo hebraico traduzido por “salvação” (yeshu‘ah) significa "libertação" ou "livramento". Assim, Isaías não fala necessariamente de uma consequência da salvação, mas de uma condição permanente de libertação concedida por Deus ao seu povo. Em outras palavras, o profeta ensina que aquele que foi liberto pelo Senhor jamais terá sua condição de salvo revertida (cf. Is 45:17; 51:6; 54:17), e isso é deixado bem claro no próprio versículo ao afirmar que "vocês não serão envergonhados nem humilhados, por toda a eternidade".

Hebreus 6:2 e o suposto juízo eterno em consequências 

"Por isso, pondo de parte os princípios elementares da doutrina de Cristo, deixemo-nos levar para o que é perfeito, não lançando, de novo, a base do arrependimento de obras mortas e da fé em Deus, [2] o ensino de batismos e da imposição de mãos, da ressurreição dos mortos e do juízo eterno." (Hebreus 6:1-2 ARA)

Os aniquilacionistas também gostam de falar em juízo eterno, mas sempre com a intenção de defender a ideia de um suposto “eterno nos efeitos”. Alegam que Deus não julgará para sempre, mas que o julgamento trará consequências eternas.
 
Cheguei a pensar, em um primeiro momento, que "krima" termo grego para "juízo" englobasse tanto a decisão quanto a execução da pena. No entanto, depois de uma pesquisa simples, sem rodeios, vi que "krima" significa basicamente, segundo o Dicionário Strong "sentença" ou “veredito”. E se você não sabe o que é uma sentença ou um veredito, trata-se simplesmente da decisão final que o juiz toma sobre um caso — seja para absolver, seja para condenar.
 
Em outras palavras, podem se passar mil, um milhão, um bilhão ou um trilhão de anos — a decisão de Deus, o grande Juiz, jamais será alterada. Ela é eterna.

Hebreus 9:12 e a suposta eterna redenção consequências 

"Mas Cristo, tendo vindo como sumo sacerdote dos bens já realizados, por meio do maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos de homens, isto é, não desta criação, nem pelo sangue de bodes e bezerros, mas pelo seu próprio sangue, entrou, uma vez para sempre, no Santo Lugar, havendo obtido uma redenção eterna." Hebreus 9:11-12 TB

 E mais uma vez nossos amigos insistem em textos-prova de eternidade em consequências para usar como paralelo com o destino eterno dos ímpios, escolhendo Hebreus 9:12. 

É reafirmando mais à frente ao dizer:

"Por isso, ele é Mediador de uma nova aliança, para que, tendo intervindo a morte para a redenção das transgressões que havia debaixo da primeira aliança, os que têm sido chamados recebam a promessa da eterna herança." Hebreus 9:15 TB

O texto de Hebreus 9:12, também mencionado no versículo 15, é facilmente compreendido à luz do contexto imediato e à luz de outras passagens bíblicas.

O termo "redenção" aqui pode ser entendido como "resgate", similar ao que Paulo expressa quando afirma que Cristo morreu para nos remir ou resgatar de toda a iniquidade (Tito 2:14). Já em Colossenses 1:14 e Efésios 1:7, Paulo fala sobre a redenção em Cristo, a qual descreve como "a remissão dos pecados". O termo "remissão", proveniente do grego, pode ser traduzido como libertação ou afastamento, sendo que o significado mais apropriado parece ser "afastamento", pois se alinha melhor com a ideia de "remover" os pecados mencionada em Hebreus 10:4.

Com isso em mente, ao analisarmos o contexto imediato, observamos que os sacrifícios do Antigo Testamento eram temporários, necessitando ser repetidos para cobrir pecados subsequentes. Em contraste, o resgate operado por Cristo é eterno, pois Seu sacrifício cobre toda a vida da Igreja, abrangendo os pecados do passado, do presente e do futuro, ao contrário dos sacrifícios antigos, que eram temporários e exigiam repetição.

"acrescenta: Também de nenhum modo me lembrarei dos seus pecados e das suas iniquidades, para sempre. [18] Ora, onde há remissão destes, já não há oferta pelo pecado." Hebreus 10:17-18 ARA

Salmo 9:5 e o suposto apagamento eterno em consequências 

"Tu repreendeste as nações e destruíste os ímpios; apagaste o nome deles para todo o sempre." Salmo 9:5 NVI

Se eu fosse aniquilacionista, pensaria duas vezes antes de usar o Salmo 9:5. Quando o texto diz que os ímpios serão “apagados para sempre”, isso significa que essa condição — o fato de estarem apagados — continuará pela eternidade. Agora, a pergunta é: isso favorece a visão deles ou a nossa?

Veja o padrão deles: quando dizem que o fogo é eterno, não estão falando de um fogo que continua queimando eternamente, mas de um fogo que atua por um tempo e causa um efeito eterno — a extinção. Ou seja, para eles, a ação é uma coisa e o resultado final é outra totalmente diferente. A mesma lógica aplicam ao castigo: o castigo seria só a ação, e o efeito duradouro seria a destruição total.

Já nós entendemos diferente. Quando dizemos que o fogo é eterno, estamos afirmando que ele nunca se apaga — que ele permanece ativo pela eternidade. O mesmo vale para o castigo: não é só o efeito que dura, é o próprio castigo que continua.

E da mesma forma, quando dizemos que os ímpios serão apagados para sempre, estamos dizendo que essa condição — estarem apagados — permanecerá eternamente. Não que isso vai gerar um outro efeito separado que será eterno, mas que o próprio estado de apagamento é o que dura para sempre.

É claro que, sem dúvida, há muitos outros exemplos ruins de citações, mas acredito que a explicação de Salmo 9:5 seja suficiente para derrubar todas as demais tentativas. Para o aniquilacionista, a ação seria uma coisa, e o efeito, algo completamente diferente — este, sim, seria eterno.

Antes, ao citarmos textos como Daniel 12:2 e Mateus 25:46, os defensores do aniquilacionismo alegavam que o termo "eterno", aplicado aos ímpios, significava apenas um longo período de tempo. Justificavam isso com base nos termos aionios (grego), em Mateus 25:46,  e owlam (hebraico), em Daniel 12:2, que podem, de fato, se referir a um tempo indefinido. No entanto, esse argumento mostrava-se frágil e incoerente, pois seria ilógico afirmar que a vida dos justos é eterna em duração, enquanto o destino dos ímpios — mencionado na mesma sentença e qualificado pelo mesmo adjetivo — não o seria.

Contudo, mesmo ao adotarem uma nova abordagem interpretativa, a dificuldade permanece. É absurdo supor que, enquanto a vida é eterna em duração, o castigo dos ímpios seja apenas eterno em suas consequências. A própria estrutura do texto exige uma correspondência de sentido entre os dois destinos. 

Com todo o respeito a quem pensa assim, o aniquilacionismo tornou-se um verdadeiro camaleão: muda sua aparência conforme o ambiente, adapta seus argumentos conforme a necessidade, mas mantém intacta sua essência. Pintar-se com as cores da Escritura não o transforma em verdade bíblica. Por mais que tentem reconfigurar os termos, reinterpretar os textos e forçar sentidos, a mensagem das Escrituras permanece inalterável: a eternidade da vida e do castigo são paralelos inseparáveis no juízo divino. E nenhuma maquiagem interpretativa mudará isso.

Fontes pesquisadas:

[1] EXEGETICAL GREEK TESTAMENT. Comentário sobre Marcos 3:29. Disponível em: https://biblehub.com/commentaries/egt/mark/31.htm. Acesso em: 23 abr. 2025.

[2] BIBLE HUB. Strong's Concordance – Greek: λύτρωσις (G3085). Disponível em: https://biblehub.com/greek/3085.htm. Acesso em: 23 abr. 2025.


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