O sábado foi feito para a humanidade?

 


A paz do Senhor! Hoje estarei abordando mais um texto utilizado para defender a vigência da guarda do sábado para toda a humanidade, tanto judeus quanto gentios. Quando afirmamos que o cristianismo não exige que os judeus abandonem o judaísmo, o que inclui a continuidade dos ritos da lei, como a guarda do sétimo dia, muitos sabatistas recorrem a Marcos 2:27 para tentar estender esse mandamento a todos os homens. Será que esse argumento procede?

Para começar, é importante ressaltar que os sabatistas possuem uma estratégia engenhosa para fundamentar suas convicções. Além de citar Marcos 2:27, que afirma que "o sábado foi feito por causa do homem", eles geralmente interpretam essa expressão como se referindo à humanidade em geral. Associam isso ao fato de Deus ter descansado no sétimo dia e o abençoado no princípio, quando ainda não existiam judeus. Assim, para eles, Marcos 2:27 estaria, de maneira sutil, conectando-se ao relato de Gênesis. Outra tentativa de reforçar essa visão seria combinar os textos mencionados com Êxodo 20, que afirma a obrigatoriedade sabática porque Deus descansou no sétimo dia: "Porque em seis dias fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo que neles há, e ao sétimo dia descansou; portanto, abençoou o Senhor o dia do sábado e o santificou". (Êxodo 20:11 ARC).

O grande erro dos sabatistas é simplesmente não considerarem o contexto total das Escrituras. Por exemplo, o próprio livro de Êxodo é enfático ao afirmar que o sábado é um sinal entre Deus e a nação de Israel, declarando: "Entre mim e os filhos de Israel será um sinal para sempre; porque em seis dias fez o Senhor os céus e a terra, e ao sétimo dia descansou, e restaurou-se". (Êxodo 31:17 ARC). O próprio Deus explica que esse mandamento seria algo que separaria o povo de Israel das outras nações: "Porquanto isso é um sinal entre mim e vós nas vossas gerações, para que saibais que eu sou o Senhor, que vos santifica". (Êxodo 31:13 ARC).

A expressão "santificar" (qadash) carrega a ideia de "separar", como pode ser vista nesta passagem: "Mas tu, ó Senhor, me conheces; tu me vês e provas o meu coração para contigo. Arranca-os como ovelhas destinadas ao matadouro e separa-os (qadash) para o dia da matança". (Jeremias 12:3). Em outras palavras, assim como o sumo sacerdote possuía mandamentos que o separavam dos demais israelitas para Deus (Êxodo 28:36), a nação de Israel também tinha mandamentos que a separavam das outras nações, como no caso do sábado e da circuncisão.

Gênesis 17:10-11 (ARC): "Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós, e a tua descendência, depois de ti: que todo o macho será circuncidado. E circuncidareis a carne do vosso prepúcio; e isto será por sinal da aliança entre mim e vós."

Na verdade, o próprio texto de Êxodo 31, que afirma que o sábado é um sinal entre Deus e Israel, repete a mesma redação encontrada em Êxodo 20, tão caro aos sabatistas. No versículo 17, lemos: "Entre mim e os filhos de Israel será um sinal para sempre; porque [motivo] em seis dias fez o Senhor os céus e a terra, e ao sétimo dia descansou". Ou seja, embora Deus tenha descansado no sétimo dia e o santificado, Ele deu essa ordenança especificamente para a nação de Israel.

Ao se depararem com Êxodo 31, muitos costumam citar Isaías 56 para afirmar que o sábado é um mandamento universal, válido para todos, incluindo gentios. Eles também recorrem a Deuteronômio 23, que exclui eunucos da congregação de Israel, sugerindo que Isaías 56 representa uma inclusão irrestrita, onde até os eunucos seriam aceitos caso guardassem o sábado. No entanto, esquecem que, embora muitos mandamentos sejam dirigidos especificamente aos judeus, como é o caso da Páscoa, um gentio poderia aderir e observá-los, caso desejasse ser parte do pacto, como é claramente exposto em Êxodo 12:48. Assim, Isaías 56 deve ser entendido dentro de um contexto mais amplo de graça e aceitação para aqueles que se dispusessem a seguir os preceitos de Israel, mas sem negar a distinção da aliança dada ao povo judeu.

Isaías 56 deve ser lido à luz de Neemias 13, onde a observância do sábado é claramente aplicada dentro do território israelita. Neemias relata que, durante sua época, os tírios, que eram gentios, traziam mercadorias para vender aos filhos de Judá, violando assim o descanso sabático: "Também habitavam em Jerusalém tírios que traziam peixes e toda sorte de mercadorias, que no sábado vendiam aos filhos de Judá e em Jerusalém" (Neemias 13:16, ARA). Isso demonstra que, mesmo no território israelita, onde a santidade do sábado era rigorosamente observada, gentios estavam presentes e, se quisessem participar das práticas de Israel, deveriam respeitar as leis dadas a eles, como o sábado. Além disso, embora a lei de Deuteronômio 23 proibisse eunucos de fazer parte da congregação, isso não significa que eunucos não viviam no território, como é evidenciado em Jeremias 38:7-13, que fala de Ebed-Meleque, o eunuco etíope que ajudou o profeta Jeremias. Outro exemplo é encontrado em Jeremias 41:16, onde fala de eunucos entre os refugiados: "Então, Joãoias, filho de Carias, levou todos os homens que haviam sido recolhidos de Mispá, e entre eles estavam os eunucos" (Jeremias 41:16). Esses exemplos mostram que os eunucos estavam presentes em Israel, mas, de acordo com a lei, não podiam participar plenamente das cerimônias religiosas. No entanto, Isaías 56 mostra a disposição de Deus em aceitar aqueles que quisessem seguir Seus caminhos, sem alterar a natureza da aliança com Israel.

Mas, por meio de Cristo, toda essa separação foi desfeita, não pela observância dos mesmos rituais por judeus e gentios, mas pela fé comum em nosso Senhor, como o apóstolo Paulo declara:

"Por isso, lembrai-vos que, outrora, vós, gentios na carne [...] estáveis, naquele tempo, sem Cristo, alienados da comunidade de Israel e estranhos às alianças da promessa [...] Mas, agora, em Cristo Jesus, vós que antes estáveis longe, vos aproximastes pelo sangue de Cristo. Pois ele é a nossa paz, ele que dos dois fez um e derrubou o muro de separação [...] tendo abolido, na sua carne, a lei dos mandamentos em forma de ordenanças, para que dos dois ele criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo assim a paz [...] no qual também vós sois edificados para habitação de Deus no Espírito". (Efésios 2:11-22 TB).

Esse texto deixa claro que a separação entre judeus e gentios foi abolida em Cristo, especialmente em relação às ordenanças da lei, como o sábado.

Os sabatistas também frequentemente se apegam ao termo "homem" em Marcos 2:27 para estender a guarda do sábado a toda a humanidade. No entanto, é o próprio evangelho de Marcos que também faz referência à "tradição de homens" (Marcos 7:8), indicando que o contexto da passagem está tratando das tradições dos anciãos israelitas, não de um rito universal. Da mesma forma, em Gálatas 5:3, Paulo protesta contra "todo homem que se deixa circuncidar", mas esse aviso se refere claramente aos gentios, e não aos judeus, como podemos ver em Atos 16, onde Paulo circuncida Timóteo, um judeu. Além disso, em Lucas 21:24, Paulo não ver problema na continuidade das práticas judaicas entre os judeus, o que reforça que as advertências de Paulo sobre a circuncisão e a Lei não eram dirigidas aos judeus, mas sim àqueles que tentavam impor essas tradições sobre os gentios cristãos.

A guarda do sábado é, portanto, um assunto muito claro quando se trata de não necessidade de sua não observância: "Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados, que são sombras das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo". (Colossenses 2:16-17 ARC). O que vemos são grupos da cristandade procurando sem sucesso em outras passagens critérios para manterem vivas as suas convicções religiosas infundadas.

Em conclusão, o argumento sabatista que utiliza Marcos 2:27 para estender a guarda do sábado a toda a humanidade falha em considerar o contexto das Escrituras como um todo. Embora Deus tenha descansado no sétimo dia e o santificado, a Bíblia deixa claro que o sábado foi dado como um sinal exclusivo entre Deus e a nação de Israel. A separação entre judeus e gentios foi abolida por Cristo, e as ordenanças da lei, incluindo o sábado, não são necessárias para os cristãos gentios. O foco, agora, está na fé em Cristo, e não na observância de mandamentos específicos destinados a Israel, como também afirmado em Colossenses 2:16-17.

Referência da imagem:

PIXABAY. Shabat Shalom. Disponível em: https://pixabay.com/pt/vectors/shabat-shalom-3d-apartamento-david-4610979/. Acesso em: 28 set. 2024.



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