O [mau] uso aniquilacionista de Malaquias 4
"Pois eis que vem o dia e arde como fornalha; todos os soberbos e todos os que cometem perversidade serão como palha seca; o dia que vem os abrasará, diz o Senhor dos Exércitos, de sorte que não lhes deixará nem raiz nem ramo. Mas para vós outros que temeis o meu nome nascerá o sol da justiça, trazendo salvação nas suas asas; saireis e saltareis como bezerros soltos da estrebaria. Pisareis os perversos, porque se farão cinzas debaixo das plantas de vossos pés, naquele dia que prepararei, diz o Senhor dos Exércitos". (Malaquias 4:1-3)
A paz do Senhor! Hoje falarei sobre mais um texto mal interpretado pelos
aniquilacionistas, Malaquias 4. Em todo debate, você verá alguém citando essa
passagem, e, ainda, juntando com a passagem abaixo, em que mostra a destruição
de Sodoma e Gomorra sendo reduzidas às cinzas como um exemplo:
"e, reduzindo a cinzas as cidades de Sodoma e Gomorra,
ordenou-as à ruína completa, tendo-as posto como exemplo a quantos venham a
viver impiamente" (2Pedro 2:6 ARA)
Ao olhar para esses dois textos, um aniquilacionista ri para o tempo,
convencendo-se de que ele está seguindo a verdade bíblica, e os demais cristãos
seguem um deus antibíblico, tirano e sarcástico. Esse povo, sem perceber, comete
perversidades e é soberbo.
Antes de entrarmos no estudo do texto, é bom deixar claro que o aniquilacionismo faz uma bagunça. Ou seja, nem eles pregam o texto na literalidade, mas apenas aquilo que os convém. Por exemplo, as testemunhas de Jeová utilizam o texto, mas negam que os ímpios serão consumidos por um fogo literal. Já os adventistas acreditam que os ímpios serão atormentados no fogo por um pouco de tempo, e depois serão destruídos; e como sabemos, a imagem da palha no fogo é de algo que queima em instantes. Veja que a própria palha é levada pelo vento, mostrando fragilidade:
"[24] Pelo que os espalharei como o restolho, restolho que passa com o
vento do deserto." (
Agora retornando ao estudo do texto, um erro do homem é ler o Antigo Testamento
sem considerar o que se passa na mentalidade de um israelita da época em que o
livro foi escrito. Sem saber disso, costumamos misturar água com gasolina
achando que, por serem líquidos, são a mesma substância. E eu espero que
entendam a figura de linguagem.
É imprescindível saber que a palha consumida no fogo simbolizando os inimigos de Deus não é usada exclusivamente em Malaquias, porém em outros textos, inclusive que nem falam de fogo:
"[6] A tua mão direita, ó Senhor, é gloriosa em poder; a tua mão direita, ó Senhor, despedaça o inimigo. [7] Na grandeza da tua excelência, derrubas os que se levantam contra ti; envias o teu furor, que os consome como palha. [8] Com o sopro das tuas narinas, amontoaram-se as águas, as correntes pararam em montão; as águas profundas se tornaram sólidas no coração do mar. [9] O inimigo dizia: ‘Perseguirei, alcançarei, repartirei os despojos; a minha alma se fartará deles, arrancarei a minha espada, e a minha mão os destruirá.’ [10] Sopraste com o teu vento, e o mar os cobriu; afundaram-se como chumbo em águas impetuosas." (Êxodo 15:6-10 NAA)
Como visto, a mesma imagem da palha no fogo foi aplicado para a derrota dos egípcios, que foram mortos por água! Muita água! O simbolismo do restolho, portanto, está mais ligado à rapidez com que foram vencidos do que sua literalidade. E falando em rapidez e acrescentando falta resistência, o próprio povo em Malaquias reclama do juízo de Deus sobre os ímpios da época, que parece não haver. É bem provável que este simbolismo da palha seja uma resposta ao questionamento dos judeus:
"[13] As vossas palavras foram
hostis contra mim, diz o Senhor. Mas perguntais: O que falamos contra ti?
[14] Falastes que é inútil servir a
Deus. Que vantagem tivemos por ter cuidado em guardar os seus preceitos e por
termos lamentado diante do Senhor dos Exércitos? [15] Pois agora consideramos felizes os soberbos; os que cometem
perversidades prosperam; eles desafiam a Deus e escapam'. (
Como bem deixei claro, enquanto no capítulo 3, os soberbos e os que cometem perversidades saem ilesos; no 4, eles serão como palha, demonstrando a retomada da ideia anteriormente exposta. Note que o próprio dia é comparado a uma fornalha; as pessoas más, que sempre se livram, ao restolho dentro dela. Sabendo que palha é frágil ao ponto de ser levada pelo vento e queima rapidamente num forno, conclui-se corretamente que a ideia proposta por Malaquias é que, naquele dia/fornalha, os ímpios/palha não mais escaparão, como costumam fazer. Já a ideia de não sobrar raiz não ramo simboliza a total ausência de ímpio neste mundo depois de Deus executar o juízo.
"'Então você pisará sobre os pecadores. Eles serão como cinzas sob os seus pés. Isso acontecerá no dia em que eu agir', diz o Senhor." (Malaquias 4:1, Nova Versão Internacional do Leitor)
Os aniquilacionistas cometem um grave erro no versículo 3 ao tentar interpretar tudo literalmente. A ideia fundamental é que os ímpios serão como cinzas, e não que se transformarão literalmente em cinzas.
Embora muitas traduções brasileiras não incluam o termo “como” em Malaquias 4:3, elas o utilizam no versículo 1, ao dizer que os ímpios serão “como palha”. No entanto, o hebraico traz apenas "קַשׁ" ("qash", “palha”), sem o prefixo comparativo explícito "כְּ"("ke", “como”). Curiosamente, no mesmo versículo aparece a expressão “como fornalha” traduzindo o hebraico "כְּתַנּוּר" ("ketannur"), com o prefixo comparativo presente. Já no versículo 2, temos também “como bezerros do curral”, do hebraico "כְּעַגְלֵי מַרְבֵּק" ("ke‘aglei marbeq"). Isso mostra que a linguagem utilizada é claramente metafórica. Assim, tanto a palha (v.1) quanto as cinzas (v.3) seguem a mesma lógica figurada da fornalha e dos bezerros, que, nesses casos, trazem expressões comparativas explícitas no original. Afinal, ninguém acredita que Deus transformará pessoas literalmente em palha.
Texto original AQUI.
A ideia de pisar os ímpios em Malaquias 4:3 simboliza o total domínio sobre os inimigos de Deus. Jesus também descansará seus pés sobre os ímpios, conforme Salmo 110:1, demonstrando sua soberania. Da mesma forma, Josué 10:24 mostra os pés sobre os pescoços dos reis inimigos, como sinal de domínio absoluto. Em Miquéias 7:10, a inimiga de Israel será pisada como lama das ruas, reforçando a ideia de humilhação e vitória completa. Além disso, em Jó 40:12, Deus ordena a Jó que "pise" os ímpios e humilhe-os, como uma expressão de poder e autoridade divina. Em todas essas passagens, o ato de "pisar" representa a submissão total e a derrota definitiva dos adversários de Deus.
E por incrível que pareça, Jó, em em seu estado de extrema humilhação, declara:
"Deus lançou-me na lama, e tornei-me como pó e cinza." (Jó 30:19 TB)
Veja, caro leitor, que os casos exibidos refletem mais implacabilidade
do juízo divino sobre seus inimigos do que o cumprimento ao pé da letra da
profecia. É triste ver a atitude de certos grupos denominados seguidores de
Jesus fazerem alarde em cima do que desconhecem fazendo comentário agressivos e
blasfemos sobre o Deus bíblico, comprometendo a sua salvação e a de outrem.
Fazendo um resuminho de tudo, percebe-se que a mesma cena de Malaquias é
utilizada inclusive outra passagem da Bíblia que sequer fala de
fogo, mas de água. A simbologia está mais na fragilidade da palha dentro do
fogo do que na literalidade da expressão. O dia do Senhor será como se fosse
uma fornalha; e os que desafiam a Deus, como uma palha dentro dela; ou seja,
nunca mais escaparão.
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